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dois poemas

por júlia vita


Endurecer a casa
ao ponto que só venham
riscos que fiquem
Assim acordo solitária
e amo

Preparo o ambiente
para ser por todas as coisas
arriscado
e manter-se,
mesmo fixo,
radiar – por isso, móveis,
acordo acompanhada
e amo.

Há comigo um cuidado extremo
da libido
(escrevo e amo)
Quando limpo a casa ímpar,
sinto o cheiro da ausência e preparo
a letra,

Na solidão mais referta
uma presença me chega,
Assim é como amo

E percebo o tempo,
a variação videira – e tenho paixão
depois de quem veio


***


Quando não há mais a dizer
e a cabeça ainda fala
é fenômeno de atar-se às mínguas
e soltar liames
da língua vasta

Ataca a onça onde
a mensagem é mais sábia
no rugir e no silêncio
patas e pistas
atravessadas de milênios

Faísca a ideia que tenta
e não acende – arranha
tem-se a boca cheia de dentes
e não rasga

Nesse muro a linguagem esbarra
engolindo-se mal digerida
e regurgita no truque mais sábio
o fútil cênico –
som que não compreende
nas letras
o olho do seu incêndio.



júlia vita é artista e poeta formada em Artes pela Universidade Federal Fluminense. em 2019 publicou seu primeiro livro de poemas, Alga Viva.