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quatro poemas

por camillo josé


BANDERSNATCH

o sonho é sempre  
o mesmo:               

hemorrágica claridade
nesta varanda descoberta,

excessivo consolo  
para os artifícios da narrativa

(a song by tangerine dream).

são levianas
as possibilidades:

[i want to breathe in the open wind
i want to kiss like lovers do

                   X

so perhaps i should leave here
yeah, yeah, and go far away]

catequizar
o labirinto do verbo

com o benefício da dúvida
em estado de quaresma

                   ou

remodelar a memória da carne
(aleatório mosaico de suas cicatrizes)

até que se torne biográfica
a vitória do algoritmo.

como o fantasma
de um gesto       [relax, don’t do it]

meu corpo recusa
os dispositivos de segurança


e admite aos antibióticos
o milagre da interpretação.

[you’re just a puppet.
you are not in control]

quero que me amem
como amam

os desenvolvedores
de jogos interativos

, ter o desenho impossível de sua boca
a reger os frutos do pecado original.

_ so baby
talk to me

devagar imponha
o peso do mundo

sobre o débito desavisado
de minhas pálpebras.        [like lovers do]

_ hold me now

devagar devolva
a posse de meus esforços

ao colo inseguro
da desolação humana.

(restarting this title
will clear the choices you’ve made)

cala o fim que foge,
vai-se a voz que cansa:

eu escolho a obediência
de uma dieta rica em carboidratos

, eu decido a paleta de cores
do próximo apocalipse. 


EPISODE 18/ HANG THE DJ

pós-agora/pós-tudo
recomeça o tempo

na insuportável ternura
das soundtracks de aeroporto.

vc sugere estratégias
de subsistência

contra os princípios
circulares da porcelana

[improvise. adapt. overcome.]

, instila saliva de basilisco
para purgar minhas úlceras 

como se esperasse
que do meu peito 

ainda eclodisse
a espada de gryffindor

(our dried voices
when we whisper together)

e eu não me permito
assimilar a transparência

no riso resignado
da Murta-que-geme

(once we cross,
it could all be different.)

server report: everything
happens for a reason

: reflorestar de lírios
a troia de nossos calendários

, coexistir com o vulto-reflexo
de seus joelhos em demi-plié


PAIDEUMA BOOTLEGS

like a shipwrecked mariner
adrift on an unknown sea

você solicita o envio
de um poema acessível.

concertos para fagote
inseminados in vitro,

domesticáveis
dispositivos

de autossuficiência.

como um androide
exonerado de dores

você me pede
por favor

um poema simples.

oroboro-fibonacci
para rituais assexuados,

a estrutura em grau
de elefantíase.

um poema ausente
de ventríloquos

:enjoyment-avalanche
-performance-totem&tabu.

clutching at the straws
of respectability

você me pede um gesto
de diplomacia

enquanto somos
docilmente soterrados

pela
candura hidráulica

do poema-comum.


Τερψιχόρη

como líquidos corrosivos lubrificando
a textura vital de passagens ressentidas

anunciamos a indecência
de uma feel good inc. deteriorada

pela pequena morte
de um apocalipse customizado

(it is sinking, falling down)

eu antecipo o demônio-néon
sobre o selo de suas vértebras 

condensado na sacrossanta
vergadura de um kanji pictográfico

[a vision of ecstasy]

a música intravenosa sob
os rastros possíveis de sua lâmina

, o abismo implícito
entre os arcos de sua caligrafia

[the life inside your eyes]

minhas papilas marinadas
para o banquete futuro das musas

, nosso espectrograma tremula
contra o acaso da antimatéria

[feel the warmth, we'll never die]

porque esta noite
somos invencíveis

como deuses egípcios
fundidos em puro carbono

because tonight
we're beautiful

like DAEMONS in the sky



camillo josé é co-editor do selo La Bodeguita e autor de Chave de espadas; A dakimakura flutuante; os próximos 30min não tem propaganda graças ao seguinte patrocinador; [about: blank]; Xinforimpola; apneia-resort; hokusai song; nenhuma cefaleia acaba assim; 酔った黄色 - songs from the black lodge e stenamina boat. seu primeiro videogame foi um mega drive.