a mosca dá uns perdido
eu pergunto
cadê a praia?
entre nós
foi o que ele disse
apontando o dedo
sem precisar descer
da sua cadeira
madeira rústica e podre
cadê o esquema?
não somos ricos e complicados
vem de maionese
foi o que ele disse
em condição torta
há mais de vinte dias
eu prometo
vou carregar esse botijão
até ele explodir em algum
lugar celeste
de falsa apreciação
a beleza da mosca sendo deus
aqueles olhos que tudo veem
aquelas asas que tudo alcançam
minha mãe diria
misericórdia
tá amarrado
caiu no uso do mundo
assim como tomo posse
foi livramento
é o que eu falo
assumindo pra mim
essa história que
também é minha
o que ela pode me dar
de cheiro azedo
de sorriso estranho
como já falaram
boo & stitch nela
é o que eu sou
é como o mundo me vê
um sorriso desorientado
esperando o pouso de deus
na nuca ou no pé
esperando o acerto do tapa
esse que nunca chega
que pega em cheio
sem raquete elétrica
que mata de boca aberta
não transcende
veio pelo micro-ondas
ela disse
faz pra você uma ilha
amanhã ela chegou
com caixa e tudo
20 pila no embrulho
abri e tava lá
a ilha pronta
com trilha e
passeio de barco
coloquei na geladeira
de um dia pro outro pedra
a ilha quebrada
gelei na coca-cola
com o petróleo no estômago
chamei papai
carreguei e limpei
hoje ele continua na merda
o que ainda enlaça
o que ainda berra
desvendei a sobrevivência
espiando a armadilha
engenhoca livre
parida na interrupção
a armadilha garante a fuga
eu ouvi correr
foi como eu digeri
jessica stori é escritora e historiadora. tem 25 anos e vive em Curitiba. é graduada e mestra em História. suas áreas de pesquisa são a crítica literária feminista, o pensamento decolonial e a memória. integra a Membrana Literária, grupa crítica-afetiva de escritoras/es. seu primeiro livro, Carne e colapso, foi lançado pela Editora Urutau em maio de 2020.