SEÇÕES

três poemas

por Ismar Tirelli Neto


Aqui nos comilita o não ter asas. A clareza da falta a clareza da queda. O sumo de extinções que é agora o nosso sangue e que negreja. Nossos corpos separam-se para correr fumaça. Parado e diaspórico estou posto à janela. Observo fundo e figura com vistas a limitar. Pelas copas das árvores, por flores a que de há muito já não dão corda, com bem fraco lilás vê-se uma gente que corre. Deste ocorrer se ocupam, ocupamo-nos todos. Que povos decorrem disto? Que povos podem? Observo fundo e figura observo forma e dimensão lobrigo como que um pequeno planeta ou a espiral que o antecede. E há na cidade a espiral que a antecede. A vontade de jorrar contra Gênesis. Não ter exatamente uma natureza não ter exatamente uma cultura. Um primeiro momento antes de articularmos momento o momento cipoal momento em que todos os traços todos os atributos estão pisados numa única poção (então o nosso sangue e que negreja)

***

                                             poema de saimento

                                                           I.

                      Despedem-se dois amigos a dizer “até a vista”,
                                                  “até o mito”.

                                                           II.

                            Repercorridos, abraçam-se dois amigos,
          cada qual preside a um centro que já não pode preencher de todo.

                                                           III.

               Abraçam-se num terraço, abrem-se para infinita partida,
                                    a doma de uma infinita partida.

                                                           IV.

                             Concordam, abraçados, despedem-se:
                                a Cinelândia é uma estação da vida.

***

O corpo se apresenta à queda

Enquanto ruímos
Do solar de Circe
Um nome
Nos raive
Talvez os lábios
- chamamento,
anátema -
O nome da queda
Ela própria
O rosto, o nome
Tornando-se primeiros
Intoleravelmente
Legíveis
Enunciáveis
Como nunca
Concretada
Vertigem e
Desate de todo
Mistério:
Não pairamos.
Drones
Bimotores
Majestosos
Urubus
Pairam. Nós
Não

______________________________________
Sobre o autor:

Ismar Tirelli Neto é poeta, ficcionista, roteirista e tradutor. Nasceu em 1985, no Rio de Janeiro. Vive e trabalha atualmente em Curitiba. Lançou os seguintes livros: synchronoscopioRamerrão e Os Ilhados.