[embrulho marroquino]

a descoberta
de cinco crânios
no Marrocos
muda tudo o que sabemos
sobre homens
o paleolítico superior
a pedra polida
seres que foram contornados
em tetos rochosos
a primeira morte ritualizada
em Krapina
-fósseis decidindo sobre
vidas

eu sou menos arqueóloga
que detetive
tento unir
fragmentos
como fazem com a história
definem nomes e lugares
geralmente masculinos e distantes
embrulham silêncios em papel
de revista

será que
dentro de muito
tempo em um futuro distante
que não se pode contar em semanas
arqueólogas
vão se deparar
com exoesqueletos
de mulheres cabeludas
e carecas
mulheres que amavam
outras mulheres
será que dá
pra saber
por escavações
qual nome a gente mais
repete durante a vida
(os ossinhos dos pés
podem torcer as tristezas?
é possível raspar
os vestígios da solidão
em nossas musculaturas?)

olho agora
para tuas mãos
a constelação de pintinhas
que te habita
e não interessa tanto
se a primeira semelhante
surgiu há milhares ou milhões
de anos
deixarei minhas cartas
de amor
um bolinho amarrado em fita
podem não entender
quem perderia tempo escrevendo
poesia
é o costume com a morte.

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Sobre a autora:

Letícia Carvalho (Barreiras, 1994) é estudante de Letras Vernáculas, na Universidade Federal da Bahia (UFBA), e dá aulas de literatura para o pré vestibular popular da mesma instituição. Escreve e compartilha poemas para viver um pouco melhor.