SEÇÕES

Nº 21

por Matheus José Mineiro


percebe o enrijecimento
da musculatura,
das asas e das nadadeiras.
percebe que suas articulações
couberam perfeitamente num conto do murilo rubião.
e como uma lava-pé entusiasmada
com a formação da sua mandíbula
lê poemas no centro de uma caosfera,
lê poemas neste calabouço
arquitetonicamente barulho e cor da urbano-cidade.
lê poemas
seja na esmerilhadeira ou
na bicheira canina,
mesmo com gagueira, teimosia e cacofonia,
lê poemas
no aparelho de quimioterapia, na linha de produção fabril,
sem tímpanos, sem amígdalas,
sem colete e sem capacete;
lê poemas;
este mantimento, este armamento, estas ferramentas
usadas pelas trezentas e sessenta e cinco detentas
que escavaram um túnel de fuga da veia aorta
até a palavra resiliência.


***


dentro do peito gargalha uma usina nuclear.
mesmo no enfadonhamento costumeiro
da palavra no outdoor, no panfleto, no celular
a poeticidade da coisa ínfima possibilita
outros choques.
entusiasmada transpiração botânica
na urgência.
elétron teimoso e vivaz orbitando a arruaça,
o desabamento
e o óleo sobre tela
da remedios varo.
hoje temos as mesmas sensações da elizabeth vogler
assistindo a conflagração
do monge vietnamita
pela televisão.
são glóbulos, células, moléculas e tecidos
compondo uma máquina que delira dentro de
outra máquina social
bastante adoecida.
um cenário do pasolini grudado nas pupilas.
uma drag queen performa no carpete do universo
é soletrada a equestre
palavra resistência.
múltiplas possibilidades de sabermo-nos
átomos instigados de uma mesma ogiva,
pacientes sedados de um mesmo leito ou
lésbicas de um mesmo beijo.
algum sossego em meio a conturbação.
um estar sinuoso em dias que estão propícios
a maxilares de tubarões e abraços de sucuris.
é da colisão entre dois cometas,
entre duas carretas,
entre dois bois almiscarados no cio
que surgem sentimentos resistentes
que apertam, contorcem, parafusam
minhas artérias e músculos
como se espremesse com os pés
uma barata um brócolis uma saudade
mesmo não tendo chão nestas horas.
caminho por este calabouço azul
com pálpebras de camaleão.